domingo, 14 de fevereiro de 2010

Nús frente ao poder


Foto: Claudio Fuentes Madan
Punto e Coma animava um encontro de amigos em Dos Gardenias quando eu tinha 18 anos, ia semanalmente vê-los com uma amiga que vivia em Playa. Por aquela época um enorme operativo policial - conhecido popularmente como La Lacra - recolhia cada mulher sozinha que estivesse na rua, sob a suposta suspeita de prostituição.

Minha amiga e eu paramos na funesta Quinta Avenida, não sabíamos que era o centro de operações, e começamos a pedir carona. No primeiro carro que parou, branco, iluminado e ocupado por cubanos, perguntamo-lhes inocentemente:

-Vai reto?

Para minha estupefação absoluta um cara saiu do carro e pôs uma identidade do DTI na minha cara, enquanto com a outra mão me agarrou a nuca e sem que eu pudesse nem respirar me jogou na parte de trás do carro, encima de mim caiu minha amiga, cinco segundos depois. Dentro fiquei sabendo que estava me prostituindo e detida por fazer isso ilegalmente. De nada valeram nossas explicações, levaram-nos direto à tristemente célebre estação da Polícia Nacional Revolucionária "La Quinta".

Havia alí cerca de quarenta mulheres, muitas choravam e a maioria não passava dos dezesseis anos. Segundo uma me disse, as que não eram do interior iriam para uma prisão, enquanto as outras seriam reenviadas à suas respectivas províncias...Todas seriam processadas. O instrutor me fez um desagradavel e exaustivo interrogatório, ameaçou-me e disse que eu não tinha provas que não era uma prostituta, no que respondi que ele tampouco tinha provas do contrário...Pegou mal para ele, e pior para mim.

As quatro da manhã já havia tido sete ataques de histeria porque não me deixavam ligar para minha mãe ou meu noivo, havia fumado contra a vontade e havia tratado várias vezes de pegar o telefone público. Suponho que os policiais estariam cheios de mim, minha amiga me pedia baixinho que me acalmasse porém eu não podia. ..Naquela época, todavia, acreditava no poder da lei vigente e que poderia chamar minha mãe.

Nos soltaram as cinco, porém eu me negava a ir, exigia ser levada em casa numa patrulha - era tarde e tinha medo de ir sozinha. O instrutor me respondeu: já tens uma carta de advertência por prostituição, não queiras sair com outra.

Na manhã seguinte minha mãe e eu estávamos no Ministério do Interior, frente a Plaza. Ela assegurava que se fizéssemos a denúncia tudo se consertaria: suspenderiam a minha carta de advertência e além disso chamariam a atenção do instrutor...Pobre da minha mãe, até nisso acreditava naquela época!

Não vou detalhar a hipocrisia extrema com que nos reverenciaram e nos acolheram no MININT, inclusive um docuemento dizia que a minha carta havia sido revogada e o instrutor penalizado por um mes. Eu estava um pouco cética, depois de quinze dias de burocracia me parecia que algo não estava claro: porque não havíamos visto pessoalmente o instrutor e os policiais que me detiveram? Porque todas as declarações eram ocultas? Minha mãe me tranquilizou e acabei por esquecer o incidente.

Dois anos depois o chefe do setor da minha quadra nos visitou: depois de vinte e quatro meses de verificações finalmente haviam se dado conta de que eu não era prostituta e retiravam a maldita carta de advertência, que havia estado alí o tempo todo.

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