terça-feira, 16 de março de 2010

A espera infinita



Foto: Claudio Fuentes Madan

Conheci-o quando eu tinha dezoito anos: inteligente, alto, bonito, mulato, bilingue e mentiroso. Disse-me que era árabe e era mentira, disse-me que havia viajado e era mentira, disse-me que tinha uma noiva "yuma" (americana) que o ia tirar do país, e também era mentira. Contudo me parecia bem, gosto dos sonhadores. Ficamos amigos.

Depois a vida nos levou por caminhos diferentes: eu me cansei de esperar pela minha maneira de sair do país; todavia ele apostou pela espera infinita. Uma ou duas vezes ao ano nos vemos, cada vez mais distanciados: eu profundamente envolvida pelos acontecimentos, ele esperando e esperando.

Agora já tem quase cinquenta anos: a altura lhe dá um ar negligente, o cabelo torna-se branco e falar duas línguas já não é um atrativo. Conta-me que tem uma noiva alemã, e eu imagino o dia em que dirá que tem a maldita carta convite, essa que por tantos anos tem almejado.

Ele não está só, na "espera indefinida" se encontram quase todos os meus amigos - reclamação, visto, permissão de viagem ou bolsa - todos estão esperando esse papel que os levará para longe, muito longe da terra do Não-Tempo. Eu mesma andei esperando alguns anos pelo grande prêmio, que nunca chegou...todavia sei de amigas que ainda confiam no correio.

Terminei por defini-lo como um estado físico e espiritual: não fostes porém já não estás. Recordo que lí algo parecido em Los Perros del Paraíso, de Abel Pose, onde o almirante Cristoval Colombo - já delirante na América - exigia dos súditos que deixassem de ser e começassem a estar. É irônico, e tristemente literário, que tantos séculos depois os homens da terra que descobriu - aquela que era a mais formosa que os olhos humanos haviam visto - hajam retomado sua fórmula ao contrário: ser, porém não estar.

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