domingo, 27 de dezembro de 2009

Ano novo e umas pequenas férias



Foto: Claudio Fuentes Madan

Felicidades! Obrigado à todos que me lêem, por me traduzirem, pela solidariedade com que me tem brindado nos momentos difíceis - que são os mais duros e quando se está mais só. À todos que compartilhamos este espaço virtual desejo um ano maravilhoso e bom, e sobretudo um ano de mudança, dessa mudança que estamos esperando. Oxalá que em 2010 Octavo Cerco deixe de ser um grito de liberdade sem liberdade e seja de liberdade na liberdade.

Tirarei umas curtas férias até o dia primeiro, exibo um cartaz representativo do ambiente natalino em Havana.

FELIZ NATAL E FELIZ ANO NOVO

Nota: O blogueiro Luis Felipe já foi libertado da sua prisão, espero que neste fim de ano a blogosfera possa dormir tranquila - é uma pena que não tenham férias na segurança do estado, é disso que eles precisam.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Natal


Árvore por Lía Villares
Uma mistura de nostalgia com alegria me invade cada vez que o ano acaba, pode parecer sentimental, contudo eu sou das que adoram o natal. Talvez a origem possa estar na ausência de decorações natalinas em que vivo, na falta de alegria e em muitos sentidos na abulia cultural com que no meu país esta festa mundial é brindada.

Nem sequer a mudança de século pudemos celebrar, já que Fidel Castro estava em sua fase matemática e decidiu que o novo século começava em 2001 e não no ano zero. Somente um homem privou 11 milhões de mudar de milênio. No ano seguinte com certeza ninguém celebraria o novo século XXI, era ridículo.

Um grupo de amigos nos negamos a assumir o 24 de dezembro como mais um dia. Desde há quase dez anos nos reunimos para ceiar e mantermos a normalidade, a família unida e os amigos próximos. Torna-se impossível não notar as baixas a cada doze meses: faz uma década éramos quinze, este ano seremos sete e, já o sabemos, dois deles não estarão para o próximo 24.

Continuarei esperando - falte o que falte - o dia em que de novo seremos quinze; a mudança de século deixarei aos meus netos, encomendarei à eles a tarefa de celebrá-lo em nome de sua avó, que viveu quando o tempo era editado por um homem.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Carta aberta à Fernando Rojas


Fernando Rojas:

Dirijo-me à você com a intenção de aconselhar. Digamos que com meus 26 anos de idade hoje deicdi servir-lhe, por uns instantes, de mãe ou de consciência, como queira interpretar. Assim sendo escrevo à Fernando Rojas, o homem, e não ao Viceministro da Cultura, aquele à quem talvez, mais de uma vez - durante a infância - sua mãe disse: "Fernandito, não se bate em meninas".

Dizem - e você sabe o que vale em Havana essa terceira pessoa do plural - que durante a tristemente célebre reunião que você teve com artistas do grupo performático Omni Zona Franca, uma das justificativas aceitas para desterrar o Festival Poesia Sin Fin das instituições cubanas era que os rapazes se reuniam com a blogueira Yoani Sánchez. As resoluções e leis em que seu ministério se garantiu para limitar a entrada de cidadãos em seus estabelecimentos e atividades me são desconhecidas, porém não é sobre leis que quero falar, porque nas águas da lei, Rojas, há muito tempo que seu ministério não se banha.

O que me preocupa é sua ameaça "Se Yoani Sánchez vier, eu mesmo lhe dou uma paulada". Palavras graves, Fernando, para um homem. Porém ainda mais graves para um Viceministro que - segundo comentários dos corredores culturais - aspira tirar o prefixo vice de seu cargo. Contudo isto não é uma repreensão, é mais um chamado à cordura, à civilidade e à inteligência. Lembro-lhe que para essas tarefas o governo conta com os paramilitares, as brigadas de resposta rápida e em última instância a CIM (Contrainteligência Militar); não me parece aconselhável que um funcionário se arrogue essas tarefas por conta própria, e menos que as anuncie com antecedência, podem chegar em ouvidos impróprios e infiltrarem-se pela Internet.

Diria que um ambiente de terror sobre sua pessoa não convém, no final das contas todos sabem que Yoani Sánchez é uma escritora e você o Viceministro de Cultura, a imagem da paulada mostrou-se lamentável e desacertada.

Por outro lado posso estar me equivocando e seu vice não seja mais que um álibi, então você pertenceria a uma das organizações antes mencionadas que se ocupam em bater em civis. Nesse caso provavelmente seu pecado seja a indiscrição, porque depois de ameaçar públicamente a integridade física de uma cidadã, custará crer, Fernando, que você não é mais do que um funcionário do Ministério da Cultura.

Atenciosamente,
Claudia Cadelo De Nevi

sábado, 19 de dezembro de 2009

A decepção


Foto tirada de Geração Y

Cada vez que dizem no noticiário: "Resposta do povo combatente às atividades de um grupúsculo contrarrevolucionário", chama-me aterrorizada. Eu lhe explico que todos os abusos e vexames que os paramilitares realizam nas ruas não são dirigidos à minha pessoa - não teria capacidade física para escrever isto - porém não entende, o amor de mãe é assim.

Nos 80 não estava em Cuba, quando chegou lhe contaram porém não acreditou. Com o tempo acabou recordando os comícios de repúdio como se recordam as fábulas antigas, reais porém não vividas, sujeitas ao ceticismo materialista: ver para crer.

Porém o materialismo a abandonou, em pleno período especial descobriu que a Fé pode evitar a loucura e a avitaminose. As reuniões do partido se foram transformando em reuniões espíritas, aulas de Yoga e cursos de curas com as mãos. Um dia se deu conta: as vezes o mundo inanimado é mais transparente e claro do que essa linguagem consciente que não leva à parte alguma. Ganhou uma Fé porém perdeu outra: já não crê nos humanos, em nenhum.

Na sexta-feira, 11 de dezembro, viu pela primeira vez, no programa das 8, o que eu batizei como A Multidão e seus sobreviventes: As Damas de Branco em meio a uma massa de mulheres deformadas pelo ódio. Um mar revolto e no meio um botezinho branco flutuando a duras penas: o regresso à animalidade, a lei da selva, a violência como primeiro recurso, a exaltação suprema da infinita estupidez humana.

Ficou tres horas em estado de choque. Fiz-lhe umas brincadeiras de humor negro - sei que ela gosta - porém não reagiu. Acreditei que tudo estava liquidado nela, com certeza me enganava, nunca saberei quanto de humanismo ainda lhe ficara, nesse instante tive a certeza de que o havia perdido. Olha pela janela e não entende nada, pergunta-se "quem" e só uma resposta lhe vem à cabeça, "todos". A partir de agora. eu sei, sua solidão será incomensurável, é o preço por haver se decepcionado muito, vezes em demasia.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

El Atropello*



Não posso deixar nem um segundo de me perguntar o que eu faria se alguém batesse na porta da minha casa para tirar um pedaço da minha sala, porém não encontro resposta. Trato de imaginar o que os meus amigos de Pinar del Río estão sentindo, porém não consigo.

Simplesmente há instantes em que o escândalo e o abuso tornam-se inefáveis.

Denúncia de Karina Gálvez para Convivencia

Estou recordando, hoje, os expropriados da Cuba de 59 e de 60. Ver os bens pelos quais trabalharam durante anos e anos cairem em mãos dos que não tinham nenhum direito, já sabia que foi muito duro. Porém uma coisa é sabê-lo e outra muito diferente é vivenciá-lo. A frase do diretor da escola onde trabalho, trouxe à minha memória a época de estudante - Karina, pega tuas coisas e vamos num instante `a Direção. Jamais passou pela minham mente o motivo verdadeiro. Mais me surpreendi quando o senhor que me esperava me disse que era o diretor municipal de Educação em Pinar del Rio e que ia me levar em casa porque a direção municipal de Moradia lhe havia pedido que me levasse para uns "trâmites". Algo totalmente unusual. Perguntei, assombrei-me, alarmei-me, porém ele não dizia nada.

SMS de Dagoberto Valdés:

-Confiscado o pátio de Karina. Estão abrindo porta para construir um armazem da CIMEX ao lado, pois lhe apropriaram-se do pátio.
-Começa o ruído de novo. Fazem cimento para levantar muro de blocos. Ruído de noite, tortura psicológica.
-O chefe disse aos operários que o muro de blocos tem que ser terminado esta noite.

Solidariedade em Geração Y

*El Atropello: último disco de Los Aldeanos

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Festival de Poesia sem Fim


Entre poesia, risos, música, café e chá passei minha tarde de segunda-feira 15 de dezembro, inauguração do festival de Poesia sem Fim. Não pôde - por censura institucional - ser na casa de cultura de Alamar, onde normalmente se realizam leituras. Não obstante a casa de David, um dos membros do grupo Omni-Zona-Franca, recebeu os poetas e os admiradores da poesia.

Micro Diez em Alamar poderia num primeiro olhar parecer horrivel, existem lugares em Havana muito difíceis de serem permutados: Alamar e El Reparto Eléctrico. Porém hoje saí com a certeza absoluta de que, no fundo, Alamar não está tão mal: o que falta em estética `a pequena cidade sobra em criatividade e solidariedade a seus vizinhos.

Poderia pegar feliz em cada dia da minha vida um P11 (ônibus) só pelas leituras do poeta Manuel González Busto e sonhar durante meia hora que eu sou Gissele, a musa holandesa à quem dirige suas cartas; para escutar Francis Sánchez e aspirar a apreender em seus versos a história de Ciego de Ávila, para gritar: Quero Amor! Nos coros de David, e para fechar os olhos quando Amaury Pacheco toca os sinos.

Porém acima de todas essas coisas - no final não posso negar que ler sob lanterna é formidável - quero viver num bairro onde os vizinhos, quando forem convocados para participarem de um comício de repúdio oponham-se a fazê-lo, onde discutam e argumentem com a delegada as razões da negativa, como fizeram nessa tarde os vizinhos de David. Essa é a Cuba na qual quero viver, a que me nego a deixar de imaginar, a que um dia - sem dúvida alguma - não só se comprometerá com a poesia, senão também com todas as outras liberdades - talvez mais profanas - as que aspiro como ser humano.







segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Noites uniformizadas


Texto: La Salamandra Blanca

Ir ao cinema pelo motivo do Festival ou simplesmente passar neste dias pela 23 é supreender-se com a presença cada vez mais crescente do pessoal militar. Já não sómente policiais, agora estão acompanhados por jovens vestidos de guarda ou trajes verde-oliva. Possíves cadetes ou mobilizados do Serviço Mliltar Geral?

Fico sabendo de alguns incidentes por comentários de amigos e conhecidos: comícios de repúdio, cancelamento de eventos culturais, anunciados inclusive pela televisão, como o Festival de Poesia sem Fim que celebram já há vários anos em Alamar. Para o cúmulo me contam os gritos ofensivos e humilhantes. Até golpes em cidadãos tiveram lugar nas respostas da autoridade, uniformizada ou não, para calar os atos de manifestação cívica.

Porém, além do que me contam, somente em duas noites pude comprovar com meus próprios olhos e muito perto, neste fim de semana, incidentes que deixariam boquiaberto qualquer transeunte que passasse por perto.

Um deles foi na entrada do cinema La Rampa, que terminou com o cancelamento do filme Anticristo, tão esperado por muitos. Todas as noites em seu afã de controlar a entrada da multidão se reunem uns policiais e militares, antes mencionados. Nesta sexta-feira entre o público e eles formou-se um "empurra-empurra" mais forte do que o de noites anteriores: caras agressivas se enfrentam, risadas ao ver como um agente se enrubesce sem poder dominar, queda de alguém, até uns chinelos perdidos no chão. Quando eles não bastam, pedem reforços para controlar a multidão e chega outra patrulha próxima com outra boa quantidade de guardas de todo o tipo.

Sem que se saiba o motivo, conduzem um rapaz de uns 20 anos até uma patrulha e lhe revistam o bolso. Alguns amigos exigem respeitosamente que expliquem porque fazem isso, que devem dizer para onde e porque o levam, além disso alguém próximo pergunta o nome e o cargo do oficial. Somam-se pessoas menos jovens exigindo a causa da detenção. Muitos começam a gritar com os policiais que isso é abuso de poder, violação da constituição, chamam-lhes de abusivos. Um jovem do MINIT pergunta quem grita tal coisa para mostrar-lhe o que é abuso, fico perplexa com semelhante advertência de valentia estúpida.

O oficial, um homem de uns quarenta e poucos anos, ao parecer estava muito chateado pelo rumo que estava se formando nesta parte da rua. Altera-se e percebo que diz algo ao jovem detido de maneira agressiva, em sua cara só se via ira, o jovem lhe responde algo e alí mesmo o policial o agride, o enfia sob empurrões fortes, quase golpes, dentro da patrulha e o leva. Os amigos pedem ao grupo aglomerado para marcharem até a unidade onde supõem que o levam, para exigirem os direitos do jovem. No final todos se vão diluindo e, como disse, o filme fica sem projeção nesta noite.

No dia seguinte, muito tarde, saio do cinema e passando pela 23 com G de volta à casa, olho pasma o muro recém forrado de pedras para evitar que aí se sentem os que alí se reunem. Porém na calçada da rua algo é mais supreendente ainda. Há uns cinco policiais, um deles com uma guitarra na mão, parece-me muito raro, pela cara que tinha não pensava em nos deleitar com alguma música, o caso é que a queria confiscar de um dos rapazes do grupo ao redor. Depois de ficar alí cerca de meia hora ouvindo as súplicas e queixas dos que foram se somando, chamaram uma patrulha para terminar levando a guitarra e seu dono à uma delegacia da região.

É incrível ver como algo tão inocente como tocar guitarra numa esquina onde se junta parte da juventude de Havana é um ato delituoso, e além disso se arrogam o direito até de confiscar o objeto de distração destes rapazes. Que algo tão cândido como sentar-se num muro para tocar canções na rua possa ameaçar a autoridade é algo preocupante. Que farão? Confiscarão todas as guitarras dos que passam distraindo suas noites e a de outros nesta cidade? Provocarão constantemente a impotência de alguns e o desafio de muitos para gritar-lhes na cara o abuso de poder que constantemente cometem?

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Direitos humanos


Hoje eu não queria escrever, não sabia como começar um texto para o dez de dezembro. Não sei como expressar neste blog que os direitos humanos, no meu país, perderam seu significado. Esquecemos tudo o que está implícito nestas palavras e ficamos com aquelas que a experiência nos tem gravado anos após ano: o medo e a paranóia.

Acabo pensando que são os únicos direitos que vão ficando. De todos os outros que possam existir, uma metade foi esquecida e a outra proibida, que ao fim quase torna-se o mesmo.

Quando saio à rua e vejo aqueles que de alguma forma exercem seu pedacinho de poder - funcionários, policiais, burocratas, médicos, professores e jornalistas - e os vejo pisotear os direitos dos seus concidadãos e as vezes até seus próprios, pergunto-me se sabem o que estão fazendo, se têem consciência. Talvez minha teoria seja ingênua, porém intuo que depois de 50 anos de absolutismo esquecemos completamente o que significam coisas como: Estado de Direito, Justiça e Direitos Humanos. Tudo soa como ficção científica...Direito a que?

Por isso amanhã para a maioria dos meus vizinhos será um dia qualquer, alguns dos meus amigos serão aborrecidos pela polícia e outros visitados pela segurança do estado, com sorte nenhum sairá machucado por tirar uma foto num lugar inapropriado, o Festival de Cine continuará seu curso e ninguém se perguntará porque para ver a sessão do Chaplin há que se passar em frente de um pelotão de militares.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Com medo e tardiamente, porém com segurança.



Uma pessoa faz chegar à mim, através de outra, estas fotos de Juan Juan Almeida caminhando pela Quinta Avenida com seu cartaz "Democracia". Ainda que todas sejam de costas, são um bom exemplo de como funciona a informação em Cuba: um cidadão comum consegue tirar umas fotos escondido para que não tomem sua câmera, as fotos vão passando de mão em mão (de flash em flash) com a versão do vivenciado pelo fotógrafo, até que - mais de duas semanas depois - alguém as trás para mim.

Espero que cheguem, ainda que seja com um mes de atraso, as fotos e vídeos do que aconteceu no Karl Marx durante a venda das entradas para a cerimônia dos Prêmios Lucas.








segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

MOÇÃO DE APLAUSOS APRESENTADA PELO EXMO. SR. DEPUTADO OLNEY BOTELHO À CLAUDIA CADELO.


Diz a moção:

A Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro tem a satisfação e honra de consignar a presente MOÇÃO DE APLAUSOS À ILUSTRÍSSIMA SENHORA CLAUDIA CADELO, escritora cubana que se utiliza de um blog para denunciar a falta de liberdade da sociedade cubana. Defensora do direito à livre expressão em seu país, sofre as mais diversas agressões por conta do Regime Ditatorial da Ilha de Cuba. Contudo, mantém seu trabalho embasado nos ideiais de direito à manifestação das vozes populares e é atualmente um dos ícones da luta pelas garantias individuais de seu povo. Merece, pois, receber a presente MOÇÃO desta Casa Legislativa, onde a democracia prevalece.

Plenário Barbosa Lima Sobrinho, 25 de novembro de 2009

ass. Deputado Olney Botelho

Cartas ao presidente, um documentário de Petr Lom



Entre a grande quantidade de informação que se armazena nas memórias USB, últimamente há certa preferência pelos documentários desmitificadores das ditaduras. Chegou `a mim um excelente, sobre as cartas escritas pelos iranianos ao presidente Ahmadinejad. Milhões de cidadãos plasmam suas necesidades, dúvidas, perplexidades e misérias sobre uma folhinha de papel com a esperança de que esse homem super poderoso os alegrem um instante e se ocupe deles.

As cartas vão parar numa espécie de ministério chamado "Centro de Processamento de Cartas Presidenciais", o non plus ultra da burocracia. Alí são separadas em dois grandes grupos para serem processadas: as cartas escritas por mulheres e as escritas pelos homens. Longe de tratarem de criar uma infraestrutura governamental que permita elevar a qualidade de vida dos cidadãos, um ministério insuficiente traga milhões de papéis para exacerbar nas pessoas a ilusão do líder salvador e continuar assentando os cimentos do culto à personalidade. Porém nem Ahmadinejad lê as cartas nem as pessoas crêem nas respostas: há pouco, milhares de jovens mobilizaram as ruas de Teheran, para pressionar o suposto benfeitor à reconhecer que não havia ganho as eleições e saísse da presidência.

Os grandes Messias do poder político não acreditam senão neles: nós, a "massa", não podemos ser donos de nosso destino, não temos a capacidade de construir nossas vidas, devemos esperar pelo futuro luminoso prometido por eles que lamentavelmente nunca chega. "Cartas ao presidente" me fez recordar as cartas que alguns dos meus vizinhos escreviam, quando eu era menina, ao Comitê Central do Partido com suas demandas. Faz muito tempo que não sei de ninguém que escreva nada, parece que aqui em Cuba já deixamos de acreditar em nosso "Centro de processamento".

sábado, 5 de dezembro de 2009

Solidariedade

Espero que chegue rápido o dia em que as manifestações nas ruas cubanas sejam normais e não sejam acompanhadas por uma Conga Revolucionária*, este último considero imprescindível.

A manifestação aqui e a blogação aqui.

Obrigado pela solidariedade

*Conga revolucionária: Comício de repúdio caribenho, ver um exemplo aqui.



Regina


Foto: Aulas de Vallin na academia, matéria: direito.

Conheci a Regina quando me abriu a porta de sua casa as 11 da noite. Eu chegava com uma missão: consertar o computador do seu marido, o escritor Rafael Alcides. Estava disposta a formatar e reinstalar o Windows, porém o sistema estava num disco de 5G defeituoso, o drive do cd não funcionava e as portas externas não reconheciam nada. Não me restou outro remédio senão que pendurar as chuteiras e dar "o morto" ao Ciro. Terminamos as cinco da manhã.

As longas horas em que estive deitada no chão entre cabos e pedaços de motherboard me serviram para conhecer toda a família. Lembro como um sarau maravilhoso e espero que se repita sem que uma máquina quebrada sirva de intermediária.

Alcides e Regina não têm telefone. cada vez que quero dizer-lhes algo tenho que viajar pata trás no tempo e lembrar que à pequena casinha do Novo Vedado ainda não chega nenhum cabo de telecomunicações. Um dia destes lhes mandarei um telegrama, para provar.

Regina quis fazer um blog. Com seu servidor de Worpress offline aprendeu na academia a colocar um banner, publicar posts e inserir fotos e links. La Mala Letra, seu blog, viu finalmente a luz do ciberespaço em 11 de novembro. Deixo aqui um pequeno parágrafo do blog de uma mulher que, já com Internet, senão sem telefone sequer, encontrou a forma de expressar-se na web 2.0:

"Há tempos pensava em escrever, porém a percepção de não ser nada, de ter uma opinião irrelevante, salvo entre meus amigos e familiares, e sobretudo, de não poder influir nos acontecimentos, faziam que desistisse uma vez ou outra. Desde que me decidí vejo sinais em quase tudo, e nesse sentido o artigo-ensaio "Por que blogueio?" de Andrew Sullivan, veio a ser um tipo de iluminação. Como vivo em Cuba sorrio ao ler que Sullivan atualiza seu blog várias vezes ao dia. Com muito otimismo poderei fazê-lo duas vezes por semana. Nunca vi um blog pessoalmente, a Internet me foi apresentada fazem seis meses e de maneira fugaz, sendo assim corro o risco de estar sendo repetitiva, porém se entendi bem, não importa: se ajudo alguém ou alguém me ajuda, estou fazendo amigos, ou ao menos, leitores."



quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Democracy`s is in every box

Faz tempo que os dois protagonistas - Reinaldo Escobar e Carlos Verdecia - apresentaram Democracy`s is in every box num dos itinerários blogueiros, transformados hoje em academia.

O primeiro foi vítima de um mega comício de repúdio neste mes - estou coneçando a imaginar que foi um exercício do Bastião 2009; enquanto que o segundo faz quase um ano "pulou o pântano" para respirar um ar menos viciado e caminhar por ruas sem dono.

Agora o encontro por acaso no You Tube, apesar de muita água ter corrido por debaixo da ponte desde a premiere na casa de Yoani, não me fica a menor dúvida: Democracy`s is in every box, in every kilobyte que consegue entrar nesta Ilha.

sábado, 28 de novembro de 2009

Adeus ao xampú


Foto: Claudio Fuentes Madan

Tenho, como se diz por aí, o cabelo "bom". Não uso condicionador, uso qualquer tintura e meus gastos com xampú não excedem 2 CUC. Até agora tudo havia funcionado perfeitamente: Sedal, Four Seasons, Natural ou Cosas de Botica são as marcas nacionais, sempre em CUC, porém as mais baratas. Para lavar a cabeça - desde muito tempo - tem-se que pagar em "moneda dura" (CUC), que nunca chega com o salário.

No mes passado tudo começou a se complicar. Por alguma misteriosa razão a qualidade do xampú está baixa, lavo a cabeça e parece arame. Minhas amigas comentam também, é como se de um momento para o outro fôssemos obrigados a comprar "al duro" (com CUCs), bem caro.

Atordoam-me os comentários, um ambiente apocalíptico me circunda no passeio habitual. Enquanto cada vez comprar torna-se mais caro e os produtos são piores, aumenta uma conjetura popular sobre a escassez - se isto ainda é possível - a Paranóia Cotidiana: virão mais apagões, desaparecerão das lojas todos os produtos importados, acabarão com a caderneta (de racionamento), o CUC baixará ou subirá (esta bola* é a mais instável de todas), estão criando brigadas de resposta rápida de novo, etc.

O pior é que pouco me importa, estou cansada da premissa "sempre pode piorar". As vezes questiono quanto pior podemos imaginar a nossa realidade, até onde somos capazes de extender o limite do nosso "viver mal" social. Não ganhar um salário decente, aplaudir com cara de adoração ou gritar como uma horda primitiva, suportar a propaganda política, não dissentir, viver a moral dupla, não pensar, não falar, desconfiar, delatar, não escrever, não sair à rua, comer mal, não poder consertar a casa, não viajar e não lavar a cabeça parece não ser suficiente ante o novo mal: a coisa vai ficar preta.

*Bola: conjeturas que circulam de boca em boca e que tentam "adivinhar" os movimentos econômicos, políticos ou sociais do futuro imediato, a maioria das vezes em contradição com a informação oferecida nos meios de difusão de massa.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O DSI e os visitadores



Foto: Claudio Fuentes Madan

Lembro-me das visitadoras de Pantaleão e não posso evitar de notar uma relação entre as novas ocupações dos seguranças e o nome da novela de Mario Vargas Llosa. Em menos de duas semanas quase todos os meus amigos foram "visitados". Os "encontros" variaram em seu grau de formalidade - não de legalidade, visto que os orgãos de segurança do estado não se regem pela legislação vigente para o resto dos mortais - e vão da Citação Oficial sem explicação prévia, passando pelo sequestro e chegando ao recadinho desconcertante: "Faça-me o favor, diga-lhe que passe por aqui".

Por sorte minhas amizades reagem com calma, alguns até com um tremendo senso de humor. Receberam mensagens de todo o tipo, porém entre as mais patéticas estão estas duas:

-Boa noite. Diz `a teus amigos que fiquem tranquilos, já podes ir.
-Isso que o advogado Vallín ensina na Academia Blogueira é tudo mentira - estamos terminando filosofia grega, as últimas duas aulas foram sobre Aristóteles.

Parece-me penosa a situação dos orgãos de inteligência: lidar com um grupo de jovens que se dedica a estudar, pintar, ou escrever deve ser bastante decepcionante. Suponho que quando se graduaram acreditavam que salvariam a pátria de agressões externas, protegeriam a sociedade do crime organizado e lutariam contra a corrupção social e governamental. Quão triste deve ser olhar para a única coisa que serviu tanto esforço, reprimir e acossar rapazes! Quanta inveja devem sentir dos seus homólogos seguranças pelo mundo afora, desmantelando redes criminosas e salvando civis; enquanto eles anos após anos esfregam as mãos do poder, sem conseguir tirar a mancha roxa úmida que lhes reveste a cara e a roupa.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Quem está por trás de Rodney?



Foto e texto: Claudio Fuentes Madan

Tenho neste exato momento enormes dúvidas sobre que forma deveriam tomar minhas palavras para narrar e expor o acontecido na última sexta-feira, 20 de novembro de 2009, na já conflituosa esquina de 23 e G. Queria gravar jornalísticamente com a minha câmera de vídeo, um duelo verbal que suporia e proporia, acima de tudo, o início de uma conversação absolutamente pacífica entre duas pessoas: REINALDO ESCOBAR e o AGENTE RODNEY. O encontro pretendia esclarecer um caso de abuso e violência ocorrido duas semanas antes - levado a cabo por agentes da cada vez mais encoberta e subreptícia segurança do estado contra Yoani Sánchez, esposa de quem tentou, ao menos, um encontro ético para trocar palavras e critérios de índole variada.

As dúvidas que acompanham minhas palavras vêm também com medos que tentarei diluir e controlar, com o único desejo de evitar a autocensura que impediria qualquer leitor de obter a simples verdade do que percebi com meus sentidos. Fui um cidadão a mais que participou de uma atividade que se foi transformando num estranho festival de trolls (tradução por aproximação - monstros). Inclusive quando tentaram paralizar-me com ameaças disfarçadas de doces conselhos para um futuro de liberdades obscuras, advertindo-me que estava para ser preso e até me perguntando até onde estaria disposto à isto. Medos que só deixarão de serem pesos na medida em que se denuncie toda violação dos direitos próprios e alheios mais elementares, para não ter que "suportar a pata da vaca e nem dar um beijo no açougueiro, que mancha o avental impecável com sangue". E agora ao cerne da questão, porque fico, quase sempre, aborrecendo todos com meus extensos floreios.

Fui detido quando filmava a detenção de Silvio Benítez (que se manteve o tempo todo ao lado de Reinaldo Escobar enquanto eram apertados pela turba excitada) já nos momentos finais da atividade me confiscaram, dentro do automóvel que me conduzia à unidade policial, o cartão da minha câmera de vídeo. Continha todas as imagens que havia tirado como documento histórico dos feitos, e que contudo hoje, dia 22, ainda não foi devolvida, violando impunemente o artigo 19 da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS; "Todo indivíduo tem direito a liberdade de opinião e de expressão; este direito inclui o de não ser molestado por motivo de suas opiniões, e o de difundí-las sem limitação de fronteiras, por qualquer meio de expressão." Parece que não sabem que o governo de Cuba diz-se um signatário portentoso da dita declaração, pelo que suspeito que ou Raúl Castro não informou corretamente seus subalternos para fazer cumprir adequadamente a declaração, ou estão arrasando este maravilhoso parágrafo sem misericórdia, com total impunidade e cagando quanto a notícia. Procedimento raro.Incluo a notificação verbal por parte do oficial ou agente que atendeu meu caso: "Tuas imagens serão devolvidas", embora nos momentos finais me tenha informado que a memória estava estraviada por enquanto, pediu-me um voto de confiança e disse que me avisaria por telefone para sua devolução. Esperarei o prometido e minha paciência é, obrigatoriamente, insuperável, ainda que seja muitas vezes precavida com sarcasmos.

Quando cheguei na delegacia de polícia me esclareceram que estava alí detido única e exclusivamente para me protegerem da reação do povo excitado, numa luta aberta contra um grupo minoritário de pessoas que pediam diálogo em igualdade de condições. Reinaldo Escobar e os poucos amigos que estiveram com ele até o final eram catalogadas pelo conjunto de trolls disfarçados de povo, como mercenários, vermes, contrarrevolucionários, etc. Que estranho setor do povo é esse, que mistura um ato de resposta política com trajes típicos e banda de música popular? Parceria orientada para aplacar o som que deveria ser gravado por câmeras e aparelhos de áudio, para engrossar e confundir o sentido do ato com sua presença no enquadramento das imagens, tanto da imprensa estrangeira como dos jornalistas oficiais e independentes que, como objetivo comum, tinham todos o dever e o direito de gravar e capturar os fatos. Tamanha calúnia contra o conceito de povo, também contra esse outro grupo que posso chamar de nós, os sem comparsas, os que por pensar e expressarem-se diferente devem estar, momentaneamente, excluidos de toda aceitação e respeito, e que irremediavelmente são parte desse todo contraditório que é Cuba.

Isso que os agentes da ordem e a polícia decidiram chamar de POVO, acredito, não é uma representação integral do mesmo. Nem creio que o real povo cubano tenha tradição de se comportar dessa maneira. Devo informar que em nenhum momento sentí que essa massa estivesse a ponto de violentar minha integridade física, mesmo que algumas pessoas fossem golpeadas, drásticamente empurradas e acuadas. Compartilhei com elas na delegacia de polícia olhares e apertos de mão já que nos proibiram de falarmos entre nós, bem como o uso de telefones celulares. Estas medidas proibitórias, aplicadas sobre "pessoas protegidas" de uma massa de conduta extremista, não acredito que sejam orgânicas em relação ao trato ameaçador de que fomos vítimas naquela unidade. É uma lástima total que se hajam perdido as imagens que minha lente capturou, mostrariam isto em plenitude. Oxalá outras câmeras tenham material que revelem parte do ocorrido.

Enquanto a turba rodeava e quase asfixiava Reinaldo Escobar e amigos que aferravam-se entre si para, precariamente, protegerem-se uns aos outros, podíamos ver como parte da polícia nacional revolucionária, postada na avenida em pequenos grupos de dois, tres, quatro até mais, contemplavam o tumulto evidente de gritos agressivos sem intervir. Parecia estar claro que as ordens prévias incluíam essa vista grossa com um setor do povo de que precisamente se espera, e será perdoado por parte das forças repressivas, uma atitude igualmente repressiva, com total incapacidade para escutar antes de tomar determinações violentas e precisar um critério. Esse setor popular que se comete uma atrocidade, não será castigado ou recriminado, preferencialmente justificado logo como algo ocorrido: lamentável porém necessário. Como quando nos anos 80 com as saídas migratórias através do porto de Mariel, o povo açulado por quem já se sabe bem, massacrava com comícios de repúdio, ovos, exclusões de trabalho e golpes os que decidiam ir, enquanto nossas forças da ordem nunca emitiram uma denúncia contre este tipo de ações nem os chamou à cordialidade e ao respeito.

Na sexta-feira, conheci como Claudia Cadelo e muitos outros, a onda de terror, a dificuldade que é a liberdade de pensamento e sua expressão orgânica e direta. Conheci também que os indivíduos têm, ainda que seja, um mínimo de poder ao não se saberem sós, de ter algo que dizer e de estar dispostos a manifestá-lo por qualquer meio ou canal possível. Hoje reafirmei mais do nunca, que toda decisão ou idéia tem um preço altíssimo e queiras ou não, terás que pagar numa moeda ou noutra. A vida sempre nos ganha mesmo se nela formos contemplados com êxitos variados.

sábado, 21 de novembro de 2009

O terror


Foto: AP
A rua tomada por centenas, eu absolutamente não o esperava. Sei que a qualquer momento deixarão de ser pessoas e se converterão em máquinas de reprimir. Silvia e eu filmamos dentro de um carro, deixo-a em algum ponto longe do olho do furacão e volto à 23 com G. Estou muito assustada, com a câmera na mão Claudio mistura-se à imprensa internacional. Vejo quase todos meus companheiros de academia - alunos e professores. Beijo Reinaldo, faz uma brincadeira sobre as televisões, porém eu não posso rir. Quero dizer-lhe - Vamos correr! Contudo me calo, estou no mundo irracional, a pouca prudência que ainda tenho controla meus impulsos.

A minha direita há uma parede humana e uma mulher gesticula, o horizonte não existe. Eu sei, em instantes nos caem em cima, são uns quatrocentos e estou aterrorizada. Caminho para trás, não posso evitá-lo. A imprensa concentra-se em torno de Reinaldo, o ar já não é respirável. Uma das minhas companheiras de classe me diz - vamos para lá, onde estão as câmeras - não vás, digo-lhe, vão nos arrasar. Creio que por segundos corro e chego no Riviera, tenho a cabeça a mil...fugí, que horror. Volto sobre meus passos, não posso nem pegar o celular, a avalanche passa em frente gritando: Fidel!, Fidel! e nos arrasta a todos. Imediatamente tenho uns tipos atrás, um grita com lascívia: Isto está bom hoje!

Numa esquina Lía, Vallín e Iván sobreviveram À Onda. Ela se aferra ao seu laptop enquanto os outros estão numa espécie de calma reveladora - não têm medo! - penso. Mais tarde me disseram que estavam asustados, espero algum dia conseguir dominar-me como eles.

Lamentávelmente agora mesmo não posso parar no lugar, estou tremendo. Agarro Lía, paro um táxi e entro, mando uns twits, digo ao taxista que vou para Novo Vedado. Cruza a G e lhe peço que regresse. Dobramos a F e entramos na Avenida pela 21, uma Torrente Humana se move da esquerda para a direita, jamais ví coisa mais impressionante: há gritos, socos, figurantes, policiais, gente histérica, estudantes e uns cordões da segurança do estado que correm fazendo círculos de um lado para o outro. O tráfico está desviado por tipos vestidos de civil, um ciclista é empurrado rua acima, diante de nós, por um segurança gritalhão - Vai! Vai!, vaza!

Chamo Yoani - isto está fora de contrôle, vou para lá - estou convencida de que estão todos inconscientes e nós passaremos a noite chamando delegacias e percorrendo hospitais. Eu imagino Reinaldo caído na rua e esses selvagens passando-lhe por cima. O taxista está estupefato, pega um celular e faz umas fotos.

Quando chego, Reinaldo já havia chamado, não posso acreditar porém me calo. Entra pela porta e faço-lhe ver que digam o que disserem: estão vivos por milagre. Hoje o governo colocou, intencionalmente, as vidas de um grupo de pessoas em perigo. A partir deste instante responsabilizo os orgãos da segurança do estado e Raúl Castro por qualquer coisa que possa acontecer aos que hoje - depois de haverem sido arrastados por uma horda, golpeados, interrogados e detidos - finalmente chegaram em suas casas:*

-Marleny González
-Yoan Hernández
-Yadamí Domínguez
-Frank Paz
-Wilfredo Vallín
-Eugenio Leal
-Pastor Manuel
-Iván Garcia
-Silvio Benítez
-Jose Alberto Álvarez Bravo
-Lilia Castañer Hernández
-Lianelis Villares

Hoje fui covarde e me repreenderei sempre, hoje descobri O TERROR.

"Faltam-me alguns nomes de pessoas que ou não conheço ou não pude ver, prometo atualizat a lista o mais rápido possivel.
Um resumo de todo o ocorrido em Penultimos Dias.

Nota: Temos um vídeo bastante completo de todo o sucedido, é muito grande e não consegui fazer upload. Amanhã tentarei de novo.
Aqui está o vídeo:

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Yoani Sánchez e Barack Obama: Perguntas e Respostas



Presidente Barack Obama em Geração Y: Agradeço esta oportunidade com que me brindas para compartilhar impressões contigo e com teus leitores em Cuba e no mundo, aproveito para felicitar-te pelo prêmio María Moors Cabot da Escola Graduada de Jornalismo da Universidade de Columbia que recebeste por promover o entendimento mútuo nas Américas mediante tuas reportagens. Decepcionou-me que te impedissem de viajar para receber o prêmio pessoalmente.

Teu blog oferece ao mundo uma janela particular às realidades da vida cotidiana em Cuba. É revelador que a Internet haja oferecido `a ti e à outros valentes blogueiros cubanos, um meio tão livre de expressão, aplaudo estes esforços coletivo que fazem seus compatriotas para expressarem-se através da tecnologia. O governo e o povo estadunidense nos unimos a todos vocês em antecipação ao dia em que todos os cubanos possam se expressar livre e públicamente sem medo de represálias.
Ler a entrevista completa aqui.

O tamborete

Foto: Claudio Fuentes Madan

Nunca participei de uma reunião da juventude e muito menos de uma do partido. Com certeza posso imaginar as caras, o ambiente, o ar e as intervenções de muitos dos presentes. Desde que nasci quase toda minha família vivia de reunião do núcleo em reunião do núcleo.

Na época dos cartazes "O Partido é imortal" por toda a cidade, os militantes começaram a chamar suas reuniões "del Imortal". Acostumei-me a escutar frases como "Não posso te ver esta tarde, reúne-se o Imortal'. Pela cara das pessoas se deduzia que aquilo era o mais chato do universo, suponho como que uma assembléia de grupo na escola secundária multiplicada por um milhão.

Uma dessas amigas contribuintes da Imortalidade, lá pela época do Elían, ainda assim levantava a mão e mandava suas "críticas construtivas de dentro" - consta que já abandonou o longo caminho da Eternidade. Nesse dia, como de costume por aqueles dias, falava-se do caso do menino. Minha amiga levantou a mão:

-O comandante quando fala da escola de Élian González menciona sua carteira. Será que ninguém se dá conta de que Élian senta-se numa mesa? Porque não podemos corrigir esse erro do Comandante, e como esse, muitos mais?

Um dos presentes levantou-se com firmeza e sem esperar sua vez desafiou-a:

-Companheira, saiba você que Fidel disse tamborete...eu digo TAMBORETE!

A reunião acabou sem maiores consequências, porém desde então o homem é popularmente conhecido no núcleo do partido como "O TAMBORETE".

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Pobres vacas

Recebeu-me na porta desse modo - tens que ver isto, as vacas com a cabeça no ar condicionado, porque dão mais leite! Com certeza não entendi nada. Que vacas, que leite, que ar condicionado? Para cúmulo os tres produtos me são pouco familiares: nunca vejo vacas, rara mente tomo leite e o ar condicionado é um dos meus objetivos à alcançar antes dos quarenta.

Tratavam-se de imagens de arquivo dos anos sessenta. Fidel Castro parecia haver descoberto que se as vacas tinham a cabeça introduzida na climatização enquanto o resto do corpo continuava na temperatura ambiente...produziriam mais leite.

Quase não podia acreditar, compreendi que a loucura da mesa redonda havia começado 30 anos antes de que eu nascesse. O delírio foi cotidiano desde 1959 e o experimento, além da espécie humana, perturbou também o reino animal.






sexta-feira, 13 de novembro de 2009

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Regresso à cotidianeidade


Foto: Claudio Fuentes Madan

Os dias passam e tudo vai voltando a ser como antes. Yoani ainda de muletas e Orlando que se nega de ir ao médico, mesmo assim as ruas vão se parecendo de novo as ruas da minha cidade. Havana dos medos dissimulados, da pobreza que ninguem quer ver, da polícia reprimindo e corrompendo, da segurança trapaceira, da gente sem Fé e da arte decadente.

De novo os minutos de liberdade são contados no turno de hora e meia no Chaplin durante o ciclo de cinema polones. Outra vez vem meu amigo me pedir a versão atualizada de Voces Cubanas. A gente fala da situação econômica muito baixo, olhando de soslaio, a política fracassada do govêrno.

Vou no ônibus e vejo os meninos do MININT, creio que não chegam aos 18, com a mesma cara de abulia que têm todos os demais. Não posso deixar de me perguntar até onde chega a irracionalidade dos pais. Sorrío cada vez que os protagonistas da indisciplina social em pequena escala (no P4 somos a maioria por larga margem) dão o dinheiro ao chofer e não o jogam na caixinha, jogando-lhe na cara todos estes spots televisivos que dizem que ao pobre chofer não há que se dar nada: tudo para Papá Estado, Senhor Absoluto.

Vou caindo de novo em mim e olho as pessoas ao meu redor. Cansados e suados regressam às suas casas, uns rapazes diante de mim explicam como conectar dois computadores em rede, guardo porque se um dia me faz falta: cortar o cabo, unir o primeiro com o sexto e o segundo com o quarto. Imagino-os salvando uns civis de sequestradores sem documentos que dizem ser o poder supremo. Algo me diz que não falta muito para que cheguemos neste ponto, para que a solidariedade cidadã floresça nesta ilhota.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Prefiro vítima do que carrasco



Foto: Fotos Cuba Hoy

Não queria escrever, minha paranóia me dizia que deveria esperar estar outra vez no meu juízo perfeito. Nestas últimas 48 horas tenho estado irascível, ferina, histérica, compreensiva, maternal e com instintos assassinos...quis matar e quis salvar. Senti-me agradecida à polícia por proteger-me da segurança do estado e quis arrasar esse corpo que responde ante ordens de desconhecidos. Desejei estar no corpo de Yoani e sofrer a dor, senti-me merecedora de cascudos ou digna de liderar o Juízo Final. Imaginei-me capaz de perfurar a cabeça dos que na sexta-feira golpearam Yoani e Orlando e a mim não, e tenho me perguntado por que. Perdoei e voltei a julgar.

Senti a culpa e culpei, tenho me perguntado tantas coisas que não tenho tempo de me responder. Tratei de reconstruir os fatos dois milhões de vezes porém creio que as lacunas são cada vez piores. Não recordo se twittiei da patrulha, não sei se o primeiro twitt foi quando me agarrava com fervor na cintura de Yoani ou quando via suas pernas pendendo do carro preto da segurança. Não lembro se chamei, se não chamei, à quem chamei. Nem sequer me lembro da cara do segurança que ia ao meu lado. O que sei é que aguentava a vontade de vomitar todo o tempo, arrependo-me de não haver lançado todo o café que tinha no estômago em cima do meu repressor...nesse momento tratava de parecer forte.

Uma escritora amiga me disse: Para que esperas, cada vez que escreves te desvelas, não há nada que possas ocultar. Tem razão, dá no mesmo que o saibam: a brutalidade me confunde, o abuso me dá vontade de chorar, a injustiça me abala e tenho tido que lutar nestas últimas horas com um Ódio profundo que me quer assumir.

Só uma imagem me libera, imagino o diálogo do quebra-ossos com seu filho:

-Papai, o que te ensinaram na academia?
-Ensinaram-me a bater forte sem que fiquem marcas.

Então acaba-se a fúria e o repúdio, porque uma profissão tão ruim e desprezível não desperta nenhum sentimento em mim.

sábado, 7 de novembro de 2009

Violência contra a não violência



Sexta-feira, academia blogueira, terminamos a aula de cultura cubana com Miriam. Ambiente descontraído: os Taínos e os mitos. Antes de ir-se Iván me disse - Nos vemos as cinco e meia. Soubemos por amigos, sabíamos que Aldo, Luis Eligio, Amaury e outros jovens iam caminhar hoje pela 23 e G até L com cartazes contra a violência. Uma marcha cívica num país onde o civismo foi isolado pelo totalitarismo, onde o poder envelheceu e os últimos estertores de um sistema que se esboroa são uma resposta cega, chilique puro.
Ficamos, Orlando Luis, sua noiva, Yoani e eu congregados e fazendo hora para a marcha. Saimos da casa nervosos porém convencidos de que não estariamos sós. Pela rua G Orlando ia dizendo piadas das quais não me lembro porém que me faziam rir as gargalhadas. Um homem se masturbava em pleno dia em Zapata, Havana era como sempre. A parada do P11 estava repleta, 27 e G, a unica esquina onde se pode pegar algo que te leve para Alamar.
O carro apareceu do nada, chapa amarela, modelo chines novo: dinheiro para reprimir. Vamos tranquilos, me disse Yoani de brincadeira e os tipos se abaixaram com cara de não estar tranquilos, deve ser triste ser um valentão. Negamo-nos a entrar no carro, eram tres e nos ameaçavam:

-Entrem no carro agora.
-Deixem-nos ver seus documentos ou tragam um uniformizado.

Orlando tinha seu celular na mão. "Pardo não graves" - disse o de camisa alaranjada -peguei o meu. Ninguém me deu importância, enviei o primeiiro twitt...
Em menos de tres minutos chegou uma patrulha, um casal de policiais - mulher e homem - olhavam estupefatos a cena. Cumpriam ordens ligeiramente em câmera lenta, a mulher me disse:

-Não resistas.
-Eles estão sem documentos - ocorreu-me esclarece-la.

Yoani se agarrava numa moita, eu na cintura de Yoani e a mulher me puxava por uma perna. Haviam arrastado Orlando, ficou fora do meu campo de visão. Um homem na parada olhava com cara aterrorizada, as pessoas não diziam nem meia palavra. A oficial, muito jovem, me deu uma chave que me deixou imobilizada, podia ter esperneado um pouco porém fiquei atônita ao ver as pernas de Yoani saindo pela janela de trás do carro da segurança do estado.
Enfiou-me na patrulha enquanto eu gritava:Yoani!, Yoani! Porém me dei conta de que ninguém poderia ouvir-me, tudo estava herméticamente fechado, a mulher de Orlando forcejava com o policial, o corpo de Yoani era enfiado a empurrões de cabeça no carro e o telefone de Orlando saiu voando pela janela...enviei o segundo Twitt, com a esperança de que alguém entendesse mal ou bem o que eu conseguia teclar.
A garota policial subiu na patrulha e me disse:

-Porque resististe? Não queremos golpeá-los.
-Quase me rasgas a camisa - disse o outro da PNR (Polícia Nacional Revolucionária) - enquanto enfiava a noiva de Orlando no carro.

Viam-se envergonhados, por um momento acreditei que nos pediriam desculpas:

-Vocês tem suas identidades em cima? - disse ela quase docemente - e nos entregou o telefone de Orlando que soava sem parar.

Desgraçadamente chegou o de camisa alaranjada, entrou e fechou a porta...ficou ao meu lado. Os policiais se calaram o começou o diálogo.

-Claudia, desliga o telefone.
-Esquece.
-Que nojo - disse a noiva de Orlando.

O resto puro insulto, bronca surrealista.

-Teu nome não passará à história - enfatizou.
-Não me importa, porém tu nem sequer tens nome.

Quando desci do carro virou para G.

-Então será pior.
-Tuas ameaças são o teu medo. Estão no fim.
-Palhaça.

Colocar o pé na esquina da casa de Yoani me deu vertigem, não havia luz no edifício, não podia ligar para o celular de ninguém e estava ficando sem saldo. Nisso recebi a primeira chamada com um 00 em frente e soube que nada havia sido em vão, inclusive se todos haviamos sido presos e a marcha suspensa. Quando mais tarde assisti o video que Ciro me trouxe soube com certeza: estão perdidos, a contagem é regressiva.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

O personagem Tabo, 2009


Estão retransmitindo "Sua própria guerra" na televisão e parece que estou assistindo uma série extraterrestre, de um país onde as pessoas falam e se movem como no meu porém que não o é. Uma espécie de novela de Ray Bradbury, onde os alienígenas são idênticos a nós salvo por pequenos detalhes, porque somos nós em outro tempo e outro espaço. Talvez poderia compará-la também a um Discovery Chanel onde nos explicariam que o homem povou a terra por duas vezes, o documentário se aprofundaria na civilização daquele homo sapiens que uma vez, antes de um desastre natural X, ocupou o mundo em que nós vivemos agora, milhões de anos depois.

O pobre Tabo de hoje não estaria orgulhoso de ser infomante da polícia, chantageado pela PNR (Polícia Nacional Revolucionária) buscaria desesperadamente a maneira de subir numa balsa para sair batido do país antes que o descubrissem no bairro. Sua esposa, que quando não era malfeitor, passava fome e não podia alimentar sua filha, jamais lhe havia perguntado de onde saía o dinheiro que trazia para casa e seu humor, longe de piorar pelas novas relações de seu companheiro, havia se adoçado. Ele nunca pode dizer-lhe que era da PNR, pois o divórcio haveria sido ipso facto.

Com boa sorte e aproveitando sua posiçao privilegiada em ambos os bandos, nosso herói de 2009 talvez encontrasse o modo de tocar um "negocinho" que lhe permitisse atingir as metas* para que o deixassem avançar e o protegessem. Com o tempo acolheria em sua rede de corrupção "não registrada" a mesma quantidade de policiais quanto de delinquentes.

* Meta: Polícia

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Pomba da liberdade


Foto: Claudio Fuentes Madan

Na escola primária zombavam de mim porque eu não falava palavrões, no sexto ano fui premiada como Beijo da Pátria e quando entramos na secundária senti como um soco no peito. Meu desconforto não era porque eu tinha sido verme desde pequena, mas sim porque me parecia que a Beijo da Pátria deveria ser eu, que bastantes comunicados havia escrito e lido, também, além disso, ela era linda, tinha um restaurante ( paladar) e eu era gorda e com o pai em desgraça.

Porém na secundária fomos juntas para um campo de batatas doces, uma ao lado da outra desmatando canteiros infinitos, matando vermes e estreiando juntas o título de Brigada Não Cumpridora: ficamos amigas. Em tres anos mudamos de meninas para adolescentes juntas e não houve um instante entre meus 12 e meus 14 em que não houvesse estado - em boas ou más - ao meu lado. No nono grau - apesar de nossas boas notas - já éramos famosas negativamente: ouvir rock, ler novelas "complicadas" e sermos as mais excêntricas possíveis nos custou caro, à mim em casa e à ela na escola.

Aos 14 anos passou por um Conselho Disciplinar em aula, alguns alunos se levantaram e a denunciaram: fuma, ouve rock and roll, fala coisas indevidas, reúne-se com elementos antisociais, etc. Apesar de ter tido 100 de média não pode ser a primeira da lista, relegaram-na ao terceiro lugar. Nesse mesmo ano sua família ganhou o bombo (loteria de emigração) e foram-se todos para os Estados Unidos, estivemos quase dez anos sem nos ver e ainda que já não aspiremos nem a ser o Beijo da Pátria nem a entender a origem do universo - entre outras ambições - continuamos sendo amigas.

Veio a pouco e pôs-se em contato com o grupo da secundária, aquele que um dia quis tirar-lhe seus direitos acadêmicos a força de ideologia extremista. Para a minha amiga já não importa, chamou em nome dos velhos tempos, da adolescência perdida e da nostalgia. Com certeza uma das garotas que mais lhe apontou o dedo não havia esquecido. Para a antiga denunciante tudo aquilo significava algo mais: tirar do peito a culpa de repressor, de delator e de injusto. Pediu desculpas à antiga vilipendiada e eu não sei se respira melhor a partir desse dia. Alegro-me pelas duas.

sábado, 31 de outubro de 2009

O Ministério e eu





É a terceira vez que uma instituição ou ministério me nega a entrada à um lugar de livre acesso. Parece que alguns blogueiros independentes temos sido excluídos "extraoficialmente" dos eventos culturais cubanos. Digo "extraoficialmente" porque ainda não me mostraram um documento oficial com meu nome completo e meu número da carteira de identidade que diga: Esta insittuição nega a admissão de Fulanito de Tal, Siclano e Esperanzejo, segundo a legislação tal da lei tal e direito tal que este centro tem. Não tem minha foto e os seguranças não conhecem meu nome, não há uma lista que decrete que eu sou persona non grata.

Eu exijo do Ministério da Cultura que emita a dita lista, que esclareçam as razões pelas quais não posso assistir a concertos e participar de debates, que mostrem a cara e deixem de ampararem-se no vago conceito: A Instituição se reserva o direto de admissão. Eu quero que Abel Prieto articule legalmente esta exclusão para assim eu poder, legalmente também, acionar o Ministério da Cultura por discriminação cultural e ideológica. Eu quero que os funcionários acabem por mostrar a cara sem nome e assumam que a política cultural cubana é excludente e discriminatória, coloquem as cartas na mesa e os pingos nos i, deixem de usar a burocracia como escudo e os seguranças como infantaria. Eu quero também que alguém me explique de que humana maneira uma instituição pública - do povo - se pode reservar o direito de admissão e quais são as condições que regem tal direito.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Agora mesmo na Sala Fresa y Chocolate (vídeo update)





Um grupo de pessoas, entre as quais me encontro, não pode participar do debate sobre a Internet que se realiza desde as quatro da tarde na sala Fresa y Chocolate, organizado pela revista Temas. No princípio éramos uns 10 - alguns blogueiros independentes e outros que não conheço - agora se acumulam contra a grade umas 30 pessoas.

O ICAIC (Instituto Cubano de Arte e Cinema) se reserva o direito de admissão segundo os seguranças. Aqui mostro umas fotos, verei se depois posso subir mais informação.

O debate existe, porém da porta da Fresa y Chocolate para fora...não obstante, terão surpresas.


terça-feira, 27 de outubro de 2009

Porque uma depuração?


Foto: Claudio Fuentes Madan

Quase todos os paises têm um governo mais ou menos corrupto, porém que a cada quinquênio, aproximadamente, muda, e além disso responde por suas ações ante um poder civil. Têm serviços secretos que se ocupam em proteger os interêsses do país frente a possíveis ingerências externas, frente a corrupção entre os seus ministros e quadros, entre outras coisas complicadas e burocráticas; em nenhuma hipótese têm em sua atribuição de trabalho medir o grau de liberdade dos seus cidadãos para reprimi-los, filtrá-los de acordo com o seu perfil político, ocuparem-se do que os civis falam ou verificar se reunem-se livremente. No lugar de ocuparem-se em "negar" as saídas do país, impedir a entrada de cidadãos para eventos culturais, fustigar artistas e escritores pela sua obra, excluir do seu local de trabalho pessoas devido a sua postura ideológica, entre outras "atividades" nas quais nossos ministérios se especializam, os de países menos paranóicos desempenham funções mais louváveis, de acordo com a lei do país e com o perfil que lhe corresponda.

É por isso que considero que para que a transição em Cuba seja em direção à uma sociedade aberta e não para uma sociedade "com algumas saídas de emergência", algumas das pessoas hoje poderiam tirar umas boas férias e dedicarem-se, por exemplo, a prestação de serviços - que para isso não será tão difícil então conseguir-se uma licença.

Torna-se óbvio que esta pequena ilha faz algum tempo não é governada somente por anciãos, senão que muitos dos quadros médios e altos do PCC e a CI (orgão de inteligência) mantêm o status quo e desfrutam do poder quase no mesmo nível que os clássicos, porém de maneira mais dissimulada. É evidente que a pessoa que hoje decide que Yoani Sánchez não pode viajar, não pode continuar ocupando cargos de tomada de decisões numa Cuba plural, onde todos tenhamos os mesmos direitos apesar de nossa ideologia. Um funcionário que do seu posto sustenta com seu arbítrio a corrupção e a delinquencia, não pode pois ter a responsabilidade de autuar o vício social. Depurar não significa discriminar nem depreciar, porém se na Assembléia Nacional do Poder Popular continuam as mesmas pessoas que hoje aplaudem e levantam a mão, não creio que a mudança em Cuba tenha muito êxito.

sábado, 24 de outubro de 2009

Minha Suzuki


Foto: Claudio Fuentes Madan

Tirado da Saga El Ciro versus La Seguridad del Estado

Fui visitar minha avó em Santa Fé. A velha tem 193 anos e pensa que é hora de beneficiar sua família com bens que já não usa. Assim foi que me deu a notícia de que deixava para mim a moto do seu sobrinho, que saiu ilegalmente do país fazem tres anos e não lhe permitiam regressar pois estava acusado de deserção das fileiras do MININT.

Qual não seria minha surpresa quando vi que se tratava nada mais nada menos do que uma Suzuki (veículo clássico da segurança do estado). Meu Deus! Agora que caralho faço com isso? Não podia desdenhar o presente da minha avó, podia lhe infartar, assim lhe agradeci.

-Obrigado avó, vou chamar um caminhão para que venha pegá-la.
-Não meu neto, a moto está tinindo, podes ir nela.

Aquelas palavras retumbaram na minha mente. Pilotando uma Suzuki de Santa Fé até o Vedado. E se alguém me vê pilotando por aí? Vá lá!

-Monta, monta - dizia minha avó - e depois me dizes como chegaste.
-Está bem avó.
-Porém porque choras netinho?
-De emoção, avó, de emoção.

Montei naquilo e saí chispando pela 5a Avenida. Todas os rostos me pareciam conhecidos, assim eu acelerava cada vez mais. Um policial acenando a mão...merda...paro e me disponho a puxar a carteira porém de um pulo - Pum! - ele monta atrás.

-Deixa-me alí na frente que estou atrasado - disse tranquilamente.

Do caralho isso, numa Suzuki e com um policial montado atrás. No sinal da rotatória o vermelho me pega. Ao meu lado para um táxi particular com passageiros e ouço uma voz:

-Olha, você não é do Porno Para Ricardo? - tres rapazinhos se amontoavam na janela olhando estupefatos.
-Não, não, não, não sou eu - respondi.
-Acho que é - disse o outro.
-Que nada, não sou eu porra!

Acendeu a verde e me fui como um bólido.

-Ha, você é do Porno Para Ricardo, sempre soube que tinha que haver alguém alí dos nossos.
-Sim, bem...você sabe... nós sempre nos infiltrando em tudo.
-Olha deixe-me por aqui que já estou perto e sucesso com o trabalho.

Desceu e foi-se. Isso não podia continuar. Desci da Suzuki e parei um caminhão que me levou para casa.

-Quanto devo? - perguntei ao caminhoneiro.
-Ha vai me pagar, oficial?
-Puta que o pariu! Pega! - e lhe pus uma cédula no bolso.

Entrei com a Suzuki e imediatamente chamei a CI (orgão de inteligência):

-Venham, venham, tenho algo urgente para falar com vocês.

Chegaram em 2 minutos e 25 segundos, parecia que estavam a 20 metros.

-Bem Ciro, nos alegra que por fim estejas disposto a cooperar, queremos saber c...
-Não é isso. O que preciso é passar isso pra frente - interrompi indicando a moto. - É que me aflige ser visto montado nessa coisa e como vocês não se importam talvez queiram trocar por algo mais modesto, não sei...uma Carpati...qualquer merda.

Entreolharam-se.

-Ouça-me, nós não estamos aqui como traficantes de moto. Escutou? - gritou um.
-Uma Carpati você disse? - perguntou o outro - Eu tenho uma Carpati.
-Porém Alejandro! ou melhor...Rodney!
-Veja esse câmbio, é gato por lebre - retrucou Alejandro, ou melhor, Rodney.- Olhe Ciro, deixa isso aqui, amanhã mesmo lhe trago a Carpati e levo a Suzuki.
-Negócio fechado. E agora, fora da minha casa!

Fecha-se a porta e soa o telefone: Ring!

-Alô.
-Olá, Ciro por favor.
-É ele que fala.
-Me disseram que te viram hoje na Quinta Avenida...

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Confusão


Foto: Claudio Fuentes Madan

O tema Cuba cria farpas entre nós, discussões acaloradas em que alguém não sabe nem o que disse nem o que lhe responderam. Nestes dias tive uma histórica em que um grande amigo meu terminou gritando para mim: Comunista! O que provocou, como é lógico, o riso dos presentes e um pouco de tristeza em mim, pelo absurdo da situação. Não lembro o tema da disputa, talvez estivesse relacionado com o embargo econômico, porém não estou certa. No final nós dois estávamos de acordo quanto a maioria dos pontos e por algum mistério não conseguíamos compreender.

Assim anda a gente por aqui - e incluo-me na lista - emoções a flor da pele, dor incontrolável e racionalidade zero. Numa discussão entre associados é divertido, porém quando olhas por uma janela te dás conta de que o nível da confusão chega ao céu.

A desinformação e o abuso de temas políticos polarizados na imprensa e na televisão reverteram-se em separação nas relações pessoais: pais que não falam com os filhos, "a política" como tema tabu numa mesa de família e o descontentamento disfarçado de normalidade.

Temos um governo tão paternal que para controlar nossos movimentos e nossa liberdade de expressão chegou inclusive a penetrar em nosso sentimentos, a dispor nosso diálogos, a usar a confusão cidadã como arma, com o único objetivo de sustentar seu poder.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Blogação



Sonho que:

-Um dia Pablo Pacheco me chame de sua casa em Ciego de Ávila e me diga que está livre e que todos os prisioneiros de consciência também estão.
-Yoani faça um giro pelo mundo e receba por aí todos os prêmios que tem pendentes, com certeza sem haver pedido antes uma permissão de saída.
-Porno Para Ricardo toque El Comandante na Praça de Revolução.
-Entre no meu blog, da minha casa, conectada à Internet banda larga.
-Possa me comunicar com todos os meus amigos dentro de Cuba pelo Twitter e Facebook.

E além disso repito meus apelos da ação blogueira anterior:

-Renúncia total do Presidente do Conselho de Estados, dos Ministros e da Assembléia Nacional.
-Constituição de um Estado de Direito e preparação de Eleições Livres, com todos os partidos participando..
-Depuração dos Serviços Secretos, dos Cargos Públicos e Quadros do Governo pertencentes ao Partido Comunista.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A chamada dos sábados

Paneque é jornalista independente da causa dos 75, está condenado a 24 anos de privação de liberdade e encontra-se na prisão de Las Mangas, em Bayamo. Só pode fazer uma chamada semanal de 25 minutos, aos sábados. Seu tempo escasso é utilizado as vezes para me chamar, umas para me cumprimentar e outras para ditar-me seus posts. Colocamos suas palavras no blog de Pablo Pacheco, que divide o espaço com seus companheiros de causa e converteu-se na Voz de alguns dos prisioneiros de consciência.

Neste sábado Paneque me chamou, estava um pouco triste porque não tem visitas, a prisão está em quarentena: uma epidemia de conjuntivite da qual ele mesmo padece nestes momentos. Sua chamada foi sobretudo para me ditar um texto de felicitação ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pelo seu recente Prêmio Nobel da Paz. Lamentavelmente quase não pôde falar comigo: uma pessoa, cuja única função é escutar o que diz, interveio porque considerou que a conversação era contrarrevolucionária.

Aqui está a gravação do nosso diálogo obstaculizado: