domingo, 5 de setembro de 2010

Cansaço

Imagem: O Verdugo, por Luis Trápaga

Suas manhãs são as mesmas desde anos: comprar a farinha no mercado negro nas padarias estatais, conseguir os ovos que os vendedores levam escondidos nas mochilas, regatear as goiabas nas plantações para que o negócio lhe seja vantajoso. Com as altas e baixas que dependem do grau de repressão contra as “ilegalidades” que existam, consegue manter decentemente sua casa vendendo doces.

Porém as coisas se complicaram muito: por duas vezes teve que enfiar pela janela do pátio, a toda velocidade, algumas cigarrilhas que sua vizinha escondeu quando os inspetores vieram. Graças a Deus que isso não acontece frequentemente! Quando pode coloca nos cakes uns confeitos que sua irmã lhe manda de Miami onde tem uma pequena confeitaria muito próspera. Começou como ela em 2000, fazendo tudo sozinha, porém com o passar dos anos contratou uma ajudante e agora tem um negócio modesto que abastece de guloseimas uma boa parte do bairro.

Conta-me tudo com uma nostalgia infinita, uma inveja sã da sua irmã do outro lado que conseguiu “tocar pra frente”. Pergunto-lhe se pensa que Raúl Castro permitirá alguma abertura econômica, facilidades para a pequena empresa, licenças e esses tréguas mínimas que lhe tornariam a vida mais fácil. Ri-se, porém seus olhos parecem chorar – Estou velha menina, por mim dá no mesmo, cansei de esperar.

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