terça-feira, 14 de abril de 2009

O fim NÃO justifica os meios (primeira parte)


Apesar destes longos cinquenta anos do povo dividido entre "chivatones"(delatores) e "gusanos"(vermes - pessoas contra o regime)), hoje sinto-me um pouco menos segregada, um pouco mais livre de etiquetas, muito jovem e entre jovens, que como eu, estão cansados da linha ideológica que nos separa. Esta estranha sensação de reconciliação devo a um amigo que, do exterior (cumpre missão), enviou-me uma bonita mensagem. Pedi autorização para publicar nossa correspondência que foi dada, inclusive disse-me que publique seu nome: ele não acredita que lhe aconteça nada, porém eu sim, assim é que não o farei, prefiro omitir sua identidade e também o país onde neste momento trabalha.

As duas correspondências são um pouco grandes, assim decidi publicá-las em duas partes: minha resposta virá no post seguinte.

Foto: Claudio Fuentes Madan

Oi Clau!

Como vai? Fiquei muito alegre de encontrar-te no Facebook, casualidade ou não. Futricando no teu perfil e no teu blog inteirei-me de um par de coisas, dessas que no Granma e no Juventude Rebelde com certeza não saem: o caso Antúnez ( nem ideia de quem é, nem o que é que quer), o de Ciro e Claudio presos, e um par de etecéteras. Pois bem, sem mais delongas: devo-te uma explicação. Provavelmente não queiras ouvi-la (lê-la), porém mesmo assim de todo modo sinto que te devo.

Quero começar por dizer-te que não é medo o que tenho. Isso pode ter várias causas. Uma é, com certeza, o que eu vi no noticiário internacional: “Guerra no Iraque, guerra no Afeganistão, guerra na Palestina...”; Nacionais: “Ganharam todas as medalhas, romperam todos os recordes, o turismo aumenta...”; resumo: “Se não fosse pelo bloqueio aqui tudo estaria perfeito, e o resto do mundo está totalmente fodido”. Vivo na desinformação, porque, além disso, admito, tampouco me importa muito o resto (sou um tipo egoísta, ainda que não goste de admiti-lo e trate de esconde-lo quando estou com meus amigos). Só meus dramas científicos e passar tempo com os colegas. A segunda razão é meu pai. Como disse uma vez um tipo que eu conheço por aí: “Por dar um tabefe num filho de coronel nesse país são 20 anos”. Um palestino equivocado pode buscar retroativamente todo tipo de problemas e complicações em sua vida, e por isso eu ando por aí como se fosse Bruce Willis em “Unbreakable”. O que tenho, já te disse, é desinformação.
A parte da explicação: mesmo na desinformação sei que a retorcida maioria das coisas em Cuba estão fodidas. Mesmo assim, continuo sendo vermelho, porém porque? A explicação que eu te dou é esta (se é que não estou enganando a mim mesmo): creio que nossos problemas, antes que democracia e liberdade de expressão, necessitam de grandes quantidades de dinheiro para serem resolvidos, assim é que, continuo trabalhando e me portando como um bom menino, a gente que dirige (os bem acima, não o bando de corruptos intermediários) irão progressivamente resolvendo as coisas, inclusive meu trabalho atual e o que será o lugar do meu trabalho futuro, vejo neles essa motivação: supõe-se que será um lugar em que far-se-ão coisas avançadas no mundo e que dará dinheiro. Talvez tudo isso seja um castelo de nuvens, e tudo no final seja uma merda como tantas outras coisas, porém no momento confio nele. Mesmo assim tudo isso não justifica a censura sacana que nos impõe, quando só nos inteiramos de uma pequena fração das coisas que ocorrem, dentro e fora, e que bloqueiem teu blog, e bloqueiem Geração Y, e todos os demais etecéteras.

Outra parte da explicação é: suponha que tudo caia e ocorra a transição. O que evitará que nos convertamos num Haiti? A outra: não quererás tu mesma (isto é meio de brincadeira, meio a sério) apagar um cigarro na cara de alguém enquanto dizes “comunista”? Na realidade tu não, nem o resto de gente razoável que conhecemos, ou que não conhecemos. Porém respondes também pelos não razoáveis? O que evitará que, dentro de um hipotético caos inicial, não matem a machadadas a mim, minha mãe, minha irmã, meu pai e a minha avó, por ser a “família de um delator”? Quando te digo isto não é exagerando (eu sou algo exagerado por natureza, porém agora estou tratando de não sê-lo).

Tenho medo desse tipo de situação.

Resumindo: não creio que num futuro próximo vá pensar como tu, porém no que me diz respeito, tu estás antes do vermelho ou azul, porque és minha amiga, e porque, ainda que nos vejamos uma vez cada 200 anos, apoiar-me é complicado (talvez não tanto como acredito eu, porém igualmente é complicado). Alegro-me também de ter a ti e teu blog, ao menos pelos meses que me restam aqui, um lugar onde equilibrar o que leio no resto dos lugares.

Eu te repito o que disse uma vez: és livre de mandar-me para a casa da p... quando achares conveniente, vou aceitar sem o menor ressentimento. Só me entristeceria se o dissesses permanentemente, porém de qualquer modo seria porque sou inoportuno por natureza.

Um beijo bem grande e te quero muito.

Nenhum comentário: