terça-feira, 23 de junho de 2009

Do Golfito à terapia intensiva


Rolando tem 42 anos e sua filha 19, gostam de dançar e as vezes iam à discoteca juntos, embora já não vão mais. Em 16 de dezembro de 2008 haviam ido ao Golfito, uma disco em Rio Cristal; as 2 e meia da manhã sairam e pegaram um ônibus que os levaria para casa, o 160. Com eles subiu um grupo de rapazes que também estava na discoteca.

Eu recordo que nessa época as pessoas tocavam rumba nos ônibus, também haviam muitos assaltos, sobretudo de madrugada, aos passageiros e inclusive aos motoristas. A polícia então decidiu que em cada ônibus que andasse depois do ocaso, haveria um policial armado que cuidaria da ordem. A idéia, ao menos para mim, era bastante animadora (exceto pela pistola), porém o que acontece em Cuba é que ordem civil e disciplina militar são sinônimos. A gente começou a protestar porque já não se podia tocar rumba e inclusive uma vez Ciro foi proibido de tocar uns acordes (sem letra) na guitarra.

Assim mesmo tocavam um reggaetón e cantavam os do 160 de Rolando. O azar nessa noite é que os policiais estavam disfarçados de civis, ainda que mantinham o principal do uniforme: o revólver. Começaram a discutir com os rapazes e armou-se um "arranca rabo", o ônibus estava cheio e quando o ambiente tumultua geralmente as pessoas entram em pânico: não foi diferente. A polícia mandou parar o ônibus porém não deixou que abrissem as portas, queriam encurralar os culpados para que não escapassem, de madrugada em Boyeros qualquer um se perde. Todos queriam sair e a coisa ficou feia, um dos policiais (eram dois) sacou a pistola e disparou dentro do ônibus, várias vezes.

O terror foi incontrolável, as pessoas sairam pelas janelas e finalmente abriram as portas e todos trataram de sair ao mesmo tempo. Rolando tirou sua filha primeiro e quando pôs um pé no asfalto sentiu uma dor forte na perna esquerda e desmaiou.

No dia seguinte despertou na sala de terapia intensiva do hospital militar, tinha dois policiais de cada lado e ouvia longe a voz de sua mãe que dirigia-se aos uniformizados do quarto. O tiro entrou pela frente da coxa esquerda e saiu por trás, haviam lhe reconstruído a artéria femoral e o médico assegurou-lhe que estava vivo "por milagre". Outras cinco pessoas também tinham ficado feridas.

Esteve um ano sem poder trabalhar, deram-lhe uma licença sem pagamento que não logrou reclamar. Tratou de contatar advogados porém não avançou muito, aos policiais que dispararam, segundo sabe, não aconteceu nada e me afirma que uns dias depois leu no Granma um artigo falando de como estava funcionando bem a nova medida da PNR nos ônibus urbanos...aparentemente haviam condecorado alguns oficiais segundo o órgão oficial do partido. Parou de mancar há poucos meses e está convencido só de uma coisa: ele, e todos nós, estamos desprotegidos neste país.






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