domingo, 23 de maio de 2010

Sem direito de mostrar o rosto



Tornou-se habitual no Noticário Nacional de Televisão ver grupos de cidadãos protestando em diversos lugares do mundo. É irônico para nós, os cubanos, vermos mobilizados espontâneamente os setores de uma sociedade nas notícias do único sistema de informação a que temos direito. Por sua vez é gratificante: sentir que lá fora existem pessoas que intimam o poder com ações civis; e entristecedor: toma-se de repente consciência da terrível solidão em que o Estado nos deixou, um insignificante ante o todo omnipresente.

Outro dia passavam imagens de um protesto de imigrantes nos Estados Unidos e alguns dos manifestantes falavam para as câmeras. Uma mulher de uns quarenta anos se queixava: estava há vários anos no território e ainda estava sem documentos, se os operativos de imigração a encontrassem seria deportada do país. Eu olhava a televisão e pensei - por momentos esta minha Ilha cresce na minha mente e me esqueço do pequeno espaço que ocupamos no mundo - Como diz isso em frente a câmera? Agora os agentes terão seu rosto e irão lhe buscar onde quer que se esconda!

Eu me esquecia que os oficiais de emigração, os serviços de inteligência e contra-inteligência, as leis, o governo, os meios de imprensa e os sindicatos não respondem todos à mesma entidade, e menos ainda ao mesmo partido, além de que a polícia política - bendita liberdade - não existe. Na minha terra, por exemplo, o consulado cubano faz serviço de espionagem na Espanha e envia fotos aos serviços secretos cubanos e ao Ministério do Interior, para que saibam "quem se porta bem lá fora e quem não", os agentes recebem ordens diretas da Segurança do Estado para que alguns cidadãos "complicados" não possam aceder à instituições públicas, os jornalistas oficiais são separados dos seus centros de trabalho por publicarem em sítios (internet) críticas à ideologia oficial, os que se atrevem a dar notícias sem pedir permissão podem um dia levantarem-se com uma condenação de vinte anos de cárcere e os opositores políticos suportam a ira e a represália de todo o Comitê Central do Partido sobre suas cabeças.

Olho os ilegais nos Estados Unidos com seus cartazes e seus olhos desafiadores e me dá uma ligeira inveja, sei que a minha vizinha nunca se atreveria a dizer diante da lente o que esta mulher acaba de gritar ao mundo. Minha vizinha não teme ser deportada, tem carteira de identidade, um endereço fixo e um rosto que, contudo, não mostraria desacordo sob nenhuma circunstância.

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